A Urologia

Urologia é uma especialidade cirúrgica da medicina que trata do trato urinário de homens e de mulheres e do sistema reprodutor dos homens. Os médicos que possuem especialização nesta área são os urologistas, sendo treinados para diagnosticar, tratar e acompanhar pacientes com distúrbios urológicos. Os órgãos estudados pelos urologistas incluem os rins, ureteres, bexiga urinária, uretra e os órgãos do sistema reprodutor masculino (testículos, epidídimos, ducto deferente, vesículas seminais, próstata e pênis). As adrenais acabaram entrando na especialidade devido ao aspecto cirúrgico das doenças tumorais das supra-renais. Quando tem indicação cirúrgica de tumor de supra-renal o endocrinologista encaminha para o urologista.

Nos homens, o sistema urinário está integrado com o sistema reprodutor, ao passo que nas mulheres o trato urinário se abre na vulva. Em ambos os sexos, os tratos urinário e reprodutor estão próximos, o que faz com que os distúrbios de um trato geralmente afetem o outro. A urologia combina o acompanhamento de condições não-cirúrgicas como, por exemplo, infecções do trato urinário, e de condições cirúrgicas, como a correção de anomalias congênitas e o tratamento cirúrgico de cânceres. Estas anomalias na região genital são conhecidas como distúrbios geniturinários.

Estudo Urodinâmico

O estudo urodinâmico é um exame complementar que auxilia o médico no diagnóstico e no planejamento terapêutico. Diferente dos exames de imagem, seu objetivo é a análise funcional da bexiga e uretra, masculina e feminina. O exame tenta reproduzir o comportamento habitual da bexiga e uretra, correlacionando-o com o quadro clínico e outros exames do paciente, e transforma em gráfico os dados obtidos.

Inicialmente, o paciente, com a bexiga confortavelmente cheia, urina no aparelho que se assemelha a um vaso sanitário. Esta fase é chamada de Urofluxometria livre, nos informa a velocidade da micção ou força do jato urinário em ml/segundo e o volume urinado. Em seguida, após antissepsia e anestésico local, uma sonda fina (6fr) de duplo lúmen, é introduzida pela uretra até a bexiga, para medir a pressão e infundir soro, e outra sonda é posicionada no reto para medir a pressão abdominal. Inicia-se então o enchimento da bexiga artificialmente com soro fisiológico, observando seu comportamento enquanto monitoramos as sensações do paciente. Esta fase permite verificar o volume de urina que a bexiga é capaz de armazenar, sua elasticidade e sensibilidade. Ainda no enchimento procuramos identificar o surgimento de contrações involuntárias da bexiga, associadas a incontinência urinária de urgência, situação esta que pode compor o quadro da Síndrome da Bexiga Hiperativa, distúrbio funcional que atinge 16% da população. Testamos também a capacidade da uretra fechar em resposta a um esforço abdominal (tosse) e impedir a perda de urina, ou seja, verificamos a competência do esfíncter da uretra.

Urofluxometria livre
Urofluxometria livre.

Na fase de esvaziamento, durante a micção, avaliamos se a bexiga contrai normalmente, se é fraca ou forte, se há urina residual e se o paciente usa a musculatura abdominal para auxiliar a micção. Correlacionando estes dados com a velocidade ou força do jato urinário, podemos determinar se o funcionamento da bexiga e uretra é normal, ou se, havendo disfunção, o problema é a bexiga que é fraca e não contrai direito, ou ela é normal, contrai bem, mas a uretra está parcialmente obstruída, situação esta mais comum nos homens, por Hiperplasia Prostática Benigna, mas também ocorre em mulheres, por prolapso genital (útero ou bexiga caída), cirurgia para incontinência que apertou muito a uretra ou hipertonia do esfíncter sem uma causa aparente. O enchimento e a micção devem ser repetidos para confirmar os resultados, e as conclusões devem ser claras e nítidas.

Enchimento e micção. Esta paciente perde urina por contrações involuntárias da bexiga
Enchimento e micção. Esta paciente perde urina por contrações involuntárias da bexiga.

Muitos fatores podem influenciar e prejudicar o resultado do estudo urodinâmico, e um resultado mal interpretado, distante da realidade, além de submeter o paciente ao desconforto do exame, tempo e dinheiro dispendido, pode induzir o médico que o solicitou a raciocínio diagnóstico e terapêutico inadequado. Portanto, este exame deve ser realizado por médico capacitado, com equipamento moderno e calibrado, em ambiente calmo e privativo, no sentido de reduzir a ansiedade do paciente e nos aproximarmos ao máximo das suas características miccionais habituais.

Equipamento moderno e calibrado, em ambiente calmo e privativo.

Os Especialistas

Dr Luis Gustavo Morato de Toledo Dr Luis Gustavo Morato de Toledo
CRM - 92859 Possui graduação em Medicina pela Universidade Estadual de Londrina (1997), Residência em Cirurgia geral e Urologia pela Santa Casa de São Paulo
(1998-2002).
Membro Especialista da S.B.U.
(Sociedade Brasileira de Urologia – Título de especialista em 2001). Mestre (2006) e Doutor (2012) em Medicina pelo Depto. de Cirurgia geral da Santa Casa de São Paulo, Professor da disciplina de Urologia da Santa Casa de São Paulo, membro da A.U.A. (American Urological Association) e da I.C.S. (International Continence Society).

Dr Antonio João Tomaz de Aquino Dr Antonio João Tomaz de Aquino
CRM - 105615 Graduação: Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Residência em Cirurgia Geral e Urologia no Hospital Central da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Urologia - Membro Ativo da Associação Americana de Urologia e da Sociedade Internacional de Urologia.

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Temas de Saúde

Qual a relação da Incontinência Urinária com a Hiperplasia Prostática Benigna (HPB)?

A Incontinência Urinária (IU) é a perda de urina de maneira involuntária. Pode estar relacionada ao trato urinário, mais comum em homens e mulheres adultos com incontinência urinária que surgiu espontaneamente ou como sequela de acidente ou cirurgia. A IU pode também não ser relacionada a um problema no trato urinário como, por exemplo, em idosos com dificuldade de mobilidade, doença de Alzheimer ou outras doenças neurológicas, que não conseguem ou não sabem que precisam ir ao banheiro para fazer xixi. Nas crianças até saírem das fraldas, e a “incontinência” urinária é fisiológica, normal.

A IU não é uma doença, e sim um sintoma comum a diversas situações patológicas ou não. Apesar de sintomas parecidos, as causas podem ser muito diferentes entre duas pessoas com este problema. A IU no homem pode estar relacionada a problemas da próstata, como, por exemplo, em fase avançada da Hiperplasia Prostática Benigna.

A próstata é uma glândula masculina, que está localizada abaixo da bexiga e a uretra atravessa a próstata no seu centro. A próstata envolve a uretra circunferencialmente, e ela pode apresentar duas doenças principais: a Hiperplasia Prostática Benigna, que ocorre bem no centro, ao redor da uretra e o câncer de próstata, que ocorre na periferia, próximo a cápsula.

O câncer de próstata não causa sintomas urinários, por isso a importância se realizar exames anuais para a detecção precoce de câncer de próstata. Não é incomum que um homem procure o médico urologista por algum sintoma urinário, que surgiu por causa de hiperplasia prostática benigna e, com os exames realizados, descobrir um câncer de próstata, ou seja, o câncer de próstata pode coexistir com a hiperplasia prostática benigna.

A HPB é muito frequente, 20% dos homens com mais de 45 anos de idade apresentam algum grau de HPB e isso vai aumentando com a idade. Aos 80 anos, cerca de 88% a 90% dos homens apresentam HPB.

Em alguns homens a HPB vai comprimir circunferencialmente a uretra causando obstrução. A bexiga terá que fazer mais força para empurrar a urina para fora, esse esforço causado pela obstrução provocará um espessamento nas paredes da bexiga, uma hipertrofia do músculo da bexiga, ou seja, ela vai engrossando.

Esse espessamento nas paredes da bexiga pode provocar alterações neurológicas, com reflexo no controle da micção e no funcionamento da bexiga, podendo surgir à incontinência urinária.

Um a cada 8 homens com mais de 60 anos têm câncer de próstata.

Quais são os sintomas causados pela HPB?

Antes de respondermos quais os sintomas causados pela HPB precisamos dividir os sintomas urinários em dois grupos: os sintomas de armazenamento (dificuldade no armazenamento da urina) e os sintomas de esvaziamento. A próstata está mais relacionada aos problemas de esvaziamento, como por exemplo:

- enfraquecimento do jato urinário,
- jato urinário entrecortado (jato urinário que começa e para);
- gotejamento no final da micção;
- hesitação inicial na hora de urinar;
- sensação de que sobrou urina na bexiga.


Com o passar do tempo começam a surgir os sintomas de armazenamento, como aumento na frequência diurna e noturna, e depois a urgência, que é a dificuldade de segurar a urina e a pessoa precisa parar o que está fazendo e ir correndo ao banheiro e às vezes não dá tempo e a pessoa perde a urina na roupa.

Numa grande parte das vezes, no homem acima de 55 anos de idade, a urgência miccional está relacionada à obstrução prostática, como resultado da hipertrofia do músculo da bexiga e consequente alteração neurológica. O aumento na frequência urinária diurna e noturna associado à urgência miccional caracterizam a Síndrome da Bexiga Hiperativa (BH). Esta condição, a BH, pode não ter uma causa evidente, chamada então de Idiopática, ou, no homem, ser secundária a obstrução causada pela próstata.

Como podemos avaliar se a Incontinência Urinária de Urgência é secundária à obstrução causada pela HPB ou se é Bexiga Hiperativa Idiopática?

A partir da história clínica do paciente, a cronologia do surgimento dos sintomas, como eles começaram, se o paciente apresentou inicialmente sintomas de esvaziamento, tomou alguma medicação para a próstata, e depois, com o passar do tempo, veio o aumento da frequência, com piora progressiva até surgir incontinência urinária de urgência, provavelmente, a causa é a obstrução prostática. Por outro lado, se os sintomas de armazenamento, a incontinência de urgência estão presentes desde o início do quadro, e ainda mais não havendo sintoma de esvaziamento, sugere-se Bexiga Hiperativa Idiopática.

Também pelo exame físico, no toque retal, se o urologista sente a próstata aumentada e com consistência fibroelástica, reforça a hipótese de obstrução. A próstata com Hiperplasia Benigna não tem área endurecida, se ao exame de toque o médico detectar alguma área endurecida, levanta-se a suspeita de câncer na próstata e exames complementares devem ser realizados.

Alguns exames nos ajudam a esclarecer se há ou não obstrução. Na ultrassonografia, a próstata aumentada, proeminência do seu lobo médio, espessamento do músculo da bexiga, trabeculações e divertículos na sua superfície interna, associados a aumento do resíduo pós-miccional (sobra de urina dentro da bexiga após a micção), são sinais de obstrução crônica. Outro exame simples é a fluxometria, o paciente urina em um aparelho que mede a velocidade do fluxo urinário (jato) e o tempo de micção. Pacientes com obstrução prostática apresentam fluxo lento (jato fraco) e o tempo de micção prolongado. E por fim, em casos em que a dúvida persiste, o Estudo Urodinâmico deve ser indicado para esclarecer a situação. Este exame, além do fluxo e tempo de micção, mede também a pressão dentro da bexiga, a força que a bexiga faz para empurrar a urina para fora. Assim, quando a bexiga faz bastante força e o jato sai fraco e lento, está caracterizada a obstrução.

É preciso esclarecer que próstata aumentada NÃO tem relação com câncer de próstata, e sim com HPB. Próstatas grandes e pequenas têm o mesmo risco de desenvolver câncer. A próstata grande (HPB) aumenta a chance, mas nem sempre causa obstrução.

O paciente com HPB sente dor?

Normalmente não, pode haver algum desconforto leve ao urinar. A não ser que ele tenha infecção urinária ou um cálculo na bexiga, pois a obstrução causada pela HPB pode, aos poucos, dificultar o esvaziamento vesical e o paciente apresentar urina residual, ou seja, sobra de urina na bexiga, o que pode predispor a infecção e formação de cálculos.

Quais são os tratamentos para HPB?

A Hiperplasia Prostática Benigna é progressiva e deve ser tratada quando causa obstrução. Alguns medicamentos podem ser administrados no início da doença, como os alfa bloqueadores, que relaxam a musculatura involuntária da próstata e da saída da bexiga (colo vesical), facilitando a abertura da uretra durante a micção. São medicamentos sintomáticos, de ação imediata, não tratam a doença. Outra classe de medicamentos são os inibidores da conversão da testosterona. Estes podem ser prescritos quando a próstata é maior, objetivam impedir a progressão da doença, e seus efeitos sobre os sintomas são discretos. No entanto eles podem ter algum impacto negativo na qualidade de vida sexual do paciente. Uma terceira classe, mais recente de medicamento, são os inibidores da fosfodiesterase, aqueles conhecidos por tratar problemas de ereção, especialmente a Tadalafila diária pode ser utilizada no tratamento dos sintomas da HPB. Esta é uma boa opção para os pacientes que apresentam disfunção erétil e sintomas de HPB. Para tratar os sintomas de Bexiga Hiperativa associada a HPB, existe outra classe de medicamentos, os anticolinérgicos, que relaxam o músculo da bexiga, e diminuem a frequência e urgência urinária.

O tratamento curativo da HPB, quando há obstrução, é cirúrgico, a ressecção do adenoma, remove-se o “miolo” da próstata, a parte que circunda a uretra. Isto é realizado, na maioria dos casos, pela uretra, a ressecção endoscópica, transuretral, da próstata (RTU). Ao longo do tempo surgiram diversos aparelhos com tecnologias diferentes para este fim, como o laser, embolização e lift prostático nos últimos anos; mas a RTU, mono e mais recentemente a bipolar, continua sendo o “padrão ouro” no tratamento endoscópico da obstrução causa pela próstata. A cirurgia aberta ou laparoscópica, via abdominal, pode ser indicada quando a próstata é muito grande para a cirurgia transuretral.

O momento de indicar o tratamento cirúrgico é um ponto importante. A indicação cirúrgica é clara quando há complicações secundárias à obstrução, como cálculo na bexiga, infecção urinária de repetição, dilatação das vias urinárias superiores (represamento de urina), sangramentos recorrentes, hérnia inguinal associada (principalmente se bilateral), e retenção urinária com necessidade do uso de sonda. Na ausência destas complicações, a indicação do tratamento cirúrgico não tem um ponto definido na evolução da HPB e depende da discussão sobre riscos e benefícios entre paciente e seu urologista. A falha no tratamento farmacológico, na presença de obstrução, e principalmente, se sinais de repercussão sobre a bexiga, como espessamento, trabeculação e sintomas de Bexiga Hiperativa surgem ao longo do tempo, o tratamento cirúrgico deve ser aventado e discutido. É importante ressaltar que, diferente da cirurgia para câncer de próstata, a cirurgia para HPB não está relacionada a complicações como disfunção erétil e incontinência urinária.

Incontinência urinária e o envelhecimento estão relacionadas e merecem atenção

Incontinência urinária (IU) é a perda involuntária de urina. É um sintoma comum a diferentes situações, que podem ou não ter relação com o trato urinário, por exemplo, quadros demenciais ou imobilidade, no idoso, podem causar IU, sem problemas urológicos específicos. O grande impacto, ou repercussão, da IU é na qualidade de vida, a pessoa fica constrangida, deixa de fazer atividades físicas, evita o convívio social, evita ingerir líquidos, preocupa-se e planeja seu trajeto de acordo com a disponibilidade de banheiros no caminho, se afasta do cônjuge, além do gasto com absorventes e fraldas. A IU associa-se a depressão e outros distúrbios psiquiátricos. No idoso, as micções noturnas estão associadas a quedas, fraturas e até maior risco de morte.

Na mulher, as causas mais frequentes são a Incontinência Urinária de Esforço (IUE) e a Bexiga Hiperativa (BH). A IUE se caracteriza por perdas relacionadas aos movimentos, esforços, tossir, espirrar, rir, mesmo pouco tempo após uma micção, ou seja, mesmo com a bexiga vazia (sem vontade de urinar), e na BH predomina a urgência para urinar, não é possível adiar a micção, a perda ocorre, pois a bexiga contrai e empurra a urina para fora, involuntariamente, sem esforço e com vontade de urinar. A IUE foi chamada popularmente no passado de “bexiga caída”, mas trata-se de mau funcionamento da uretra, ou seja, não é um problema na bexiga. Já a BH é uma disfunção da bexiga. É importante ressaltar que estas duas afecções podem coexistir em diferentes proporções, dificultando o diagnóstico e tratamento.

Na população de meia idade, a IU predomina entre as mulheres, até 5 mulheres para cada homem apresentarão a queixa. Após os 60 anos, a prevalência nos dois sexos se aproxima, o homem também apresenta BH, que pode ou não estar relacionada à Hiperplasia da Próstata. As cirurgias da próstata, principalmente para tratar o câncer, podem causar IU permanente em cerca de 5% dos casos. A prevalência de IU aumenta significativamente com a idade, em virtude do envelhecimento da bexiga e próstata, mas também por associação de outras afecções crônicas, com Diabetes, problemas cardiológicos e neurológicos. A IU ocorre em 35% dos idosos, e quando institucionalizados, esta prevalência sobe para 50%. Assim, prevenindo e tratando adequadamente as doenças crônicas, previne-se também a IU.

A IU tem etiologia diversa e multifatorial, a investigação diagnóstica e o tratamento devem ser individualizados, realizados por profissional habilitado. A clara e completa informação ao paciente sobre seu caso, sobre as expectativas com o tratamento, é primordial para a satisfação do paciente.

A fisioterapia específica para o assoalho pélvico auxilia na prevenção e tratamento da IU. Toda mulher deveria aprender a exercitar o assoalho pélvico. A IUE pode ser tratada com cirurgia, uma fita sintética colocada transversalmente sob a uretra (Sling), com resultados ótimos quando bem indicado e tecnicamente bem realizado. Para BH, não há cura definitiva, há controle, existem medicamentos orais, injeção de toxina botulínica na bexiga e neuromodulação sacral, o “marca passo” da bexiga. Para a IU pós-cirurgia da próstata, se não melhorar até um ano após a cirurgia, existem também o Sling e o esfíncter artificial, próteses colocadas cirurgicamente para obter-se a continência.

Portanto, a IU sempre tem tratamento, a situação de cada paciente é única e deve ser investigada e discutida em detalhes. O paciente deve ser muito bem informado e compreender seu problema e o que esperar do tratamento. Sempre há como melhorar.

Dor frequente ao urinar é um problema comum em adultos e idosos? Infecções urinárias e problemas de próstata também podem desencadear dores durante a micção? Se sim ou não, por que ocorre?

Dor ao urinar, cujo nome técnico é disúria, é um sintoma inespecífico, comum a diferentes situações. A causa mais comum de dor ao urinar é a infecção urinária, especificamente a cistite e uretrites bacterianas. A cistite é comum na mulher adulta, ocorrendo em cerca de 20% delas, geralmente após o início da atividade sexual, com frequência relacionada ao coito. Apesar da associação com a relação sexual, a cistite não é sexualmente transmissível (DST), assim o homem não precisa fazer exames ou ser tratado.

O que ocorre é que a bactéria, Escherichia Coli em 80% das vezes, habita o intestino de todos nós e na mulher ela pode migrar para a vagina sem causar qualquer sintoma, e o coito facilita sua migração da vagina para a uretra e bexiga. A flora vaginal, composta por lactobacilos, é um dos principais mecanismos de defesa naturais da vagina e a mulher não deve interferir no ambiente vaginal, não usar sabonetes anti-sépticos, não fazer ducha vaginal e não usar antibióticos além do necessário, pois eles matam as bactérias boas também. Outras medidas preventivas são: manter o hábito intestinal normal (diário), ingerir bactérias boas (próbióticos com mais que 1 bilhão de lactobacilos por dose), urinar após as relações, extrato de Cranberry (mais que 400mg/dia).

Após a menopausa, por deficiência estrogênica, ocorre hipotrofia do epitélio vaginal e consequente redução de sua flora, o que torna a mulher mais suscetível às infecções urinárias. Assim, nesta fase, a reposição tópica, vaginal, de estrógeno estimula o crescimento dos lactobacilos, sendo também uma medida preventiva. Nos homens, a cistite é rara e quase sempre está associada a algum outro problema do trato urinário que dificulta o esvaziamento da bexiga. Em jovens os problemas mais comuns são neurológicos e após os 50 anos, a próstata é a culpada geralmente. As uretrites são mais comuns nos homens, nos jovens são, quase sempre, DSTs e após os 50 anos, também são causadas por bactérias intestinais, sendo aqui novamente a próstata o problema primário.

A prostatite aguda é uma infecção do trato urinário que pode ser muito grave, além da dor para urinar, pode causar retenção urinária, febre e infecção sistêmica (Sepse), pode ocorrer em qualquer idade, mas é mais comum nos homens com dificuldade de esvaziamento da bexiga por Hiperplasia Benigna da Próstata (HPB). A uretra masculina atravessa o centro da próstata, e esta vai crescendo ao longo da vida do homem e pode comprimir lenta e progressivamente a uretra, dificultando a saída da urina. A compressão da uretra pela próstata se manifesta por enfraquecimento do jato urinário, sensação de esvaziamento incompleto da bexiga, aumento da frequência de micções diurnas e noturnas, urgência para urinar e até perda urinária por não conseguir chegar ao banheiro a tempo, a chamada popularmente "urina solta", que na verdade é "urina presa". Então, a próstata, geralmente, não causa diretamente dor ao urinar, mas indiretamente sim, por facilitar a infecção urinária.

Vale ressaltar que estes sintomas descritos, relacionados à próstata são causados pela Hiperplasia Benigna da Próstata, que ocorre no centro, ao redor da uretra. O Câncer da próstata ocorre na periferia, então não causa sintomas urinários nem evacuatórios. O Câncer da próstata não causa qualquer sintoma em sua fase inicial, quando é potencialmente curável, sendo o exame de rotina essencial para o diagnóstico precoce.

“Pedra no rim” pode ser causa de micção dolorosa? No que consiste essa enfermidade?

A litíase ou cálculo urinário raramente é causa de dor ao urinar. O cálculo na bexiga ou encravado na uretra podem sim causar disúria, mas não são estas situações comuns. O que vemos diariamente no pronto socorro é a cólica renal, dor insuportável, lombar, unilateral, com irradiação para frente, associada a palidez, sudorese fria, náuseas, vômitos e diarréia, causada por cálculo encravado no ureter, canal estreito que liga o rim à bexiga. Quando o cálculo está quase entrando na bexiga, a pessoa sente vontade contínua de urinar e não sai nada ou muito pouco, a sensação é de bexiga cheia, parece que a urina está presa, mas a bexiga está vazia. Este quadro pode ser confundido com cistite, mas não há dor ao urinar, não há disúria geralmente. A dor, cólica renal, cessa completamente, quando a pedra cai na bexiga, e a pessoa quase nunca sente a pedra sair pela uretra, pois esta é muito mais calibrosa que o ureter. O cálculo de uretra ou bexiga estão, frequentemente, associados a dificuldade de esvaziamento ou corpo estranho, assim o tratamento destas condições não compreende apenas a retirada do cálculo, o distúrbio primário deve ser investigado e tratado.

A Calculose Urinária deve ser tratada de forma preventiva com redução na ingestão de proteína e sódio (o sal é a principal fonte de sódio). O Cálcio deve ser ingerido normalmente. A ingestão líquida deve ser suficiente para manter a urina clara o tempo todo, urina escura, significa habitualmente desidratação, somente a primeira urina do dia pode ser mais escura. Para tratar cálculos renais entre 0,5 e 2 cm, a litotripsia extra corpórea é uma opção, isto não é laser. Para cálculos grandes (> 2cm), ou em posições difíceis, a via percutânea, através de um furo na região lombar, é uma opção. Outra via é a ureteroscopia, endoscopia pela uretra até o rim, que pode utilizar aparelho rígido ou flexível. Nestas duas últimas vias, percutânea e ureteroscopia, podemos utilizar o laser como uma das possíveis fontes de energia para fragmentar o cálculo.

Como fazer o diagnóstico diferencial das causas de dor ao urinar?

O diagnóstico é feito pelo quadro clínico (sintomas), exame físico e exames complementares. Para a maioria dos pacientes, o diagnóstico não é difícil, mas em alguns casos precisaremos de exames específicos, por vezes invasivos e podemos, eventualmente, utilizar o teste terapêutico, ou seja, tratar sem ter certeza do diagnóstico e observar o resultado. Para o diagnóstico dos problemas prostáticos, no exame físico procuramos palpar a bexiga e a próstata (toque retal). A bexiga não deve ser palpável no abdome, sua palpação indica problema no seu esvaziamento. A retenção urinária aguda causa bastante dor que piora rapidamente e necessita de atendimento de urgência para passagem de sonda e esvaziamento da bexiga. Porém a retenção crônica, causada pela obstrução lenta e progressiva prostática, pode ser indolor e se manifestar por insuficiência renal, pois o represamento da urina atinge o rim e este para de filtrar o sangue. Frequentemente, estes pacientes referem que estão com a urina "solta" e quando palpamos seu abdome, a bexiga está ao nível do umbigo. O que ocorre é uma falência da bexiga secundária à obstrução crônica prostática e o paciente urina pequenos volumes ou apresenta incontinência por transbordamento, mantendo a bexiga sempre cheia. O toque retal nos informa o volume, anatomia e consistência da próstata. O Câncer da próstata se manifesta por nódulo endurecido, o tato é importante.

A ultrassonografia (USG) não diferencia nódulo mole de duro, por isso não é um exame de triagem (rotina) para câncer de próstata. A USG da próstata, via abdominal, serve principalmente para avaliar a bexiga e o resíduo urinário pós-miccional. O espessamento do músculo da bexiga e a presença de divertículos (pequenas saculações da mucosa) indicam que a bexiga vem fazendo muita força para urinar a muito tempo, e a presença de sobra excessiva de urina na bexiga após a micção indica que ela esta perto da falência. É importante ressaltar que com frequência observamos resíduo aumentado na USG que não condiz com a realidade, pois o paciente fica esperando para fazer o exame e acaba enchendo excessivamente a bexiga, e quando a bexiga estica demais, ela perde força e não consegue expulsar completamente a urina. O tamanho da próstata na USG abdominal não é um dado relevante e nem preciso, mas com frequência preocupa os pacientes. O tamanho da próstata não tem nenhuma relação com câncer. A próstata cresce ao longo da vida do homem, a próstata grande aumenta a chance, mas não implica obrigatoriamente em obstrução da uretra. A próstata pode ser pequena e obstruir a uretra ou apresentar câncer e ser enorme e não causar nenhum problema. O tamanho da próstata não aumenta, nem diminui o risco de câncer. Há duas perguntas que devem ser respondidas em relação à próstata que implicam em tratamento:

1) Ela está obstruindo a uretra?
2) Existe câncer?
Assim, tamanho da próstata não indica tratamento e não deve ser motivo de preocupação. O PSA continua sendo um exame importante para o diagnóstico precoce do câncer de próstata e outros exames estarão disponíveis em breve.

O aumento dos leucócitos no exame de urina não é específico para infecção, pode ocorrer em diferentes afecções inflamatórias do trato urinário, infecciosas ou não, pode ainda ocorrer contaminação da urina por secreção vaginal no momento da coleta. Há um erro comum no momento da coleta de urina, cometido principalmente pelas mulheres. Para o diagnóstico das infecções urinárias, no exame de urina, orienta-se a coleta do jato médio, (exceto nas uretrites quando deve-se colher o primeiro jato) e não deve haver interrupção do jato, ele deve ser único, contínuo, e a coleta é realizada no meio do fluxo (depois do começo e antes do fim) sem a interrupção do jato, pois toda vez que a urina começa a sair pela uretra, ela turbilhona e lava a mucosa vaginal ao redor do meato uretral, contaminando a amostra. O exame que confirma o diagnóstico de infecção urinária é a urocultura, e deve ser feito sempre que possível antes do início do tratamento. A USG, na infecção urinária, deve ser realizada quando há febre ou suspeita de anormalidade anatômica, cálculo ou corpo estranho.

A partir de quantos dias de micção dolorosa é recomendável que o paciente procure um atendimento médico?

Se a dor for aguda, intensa ou acompanhada de secreção uretral ou febre, a procura deve ser imediata, em pronto socorro se necessário. Se o quadro é mais arrastado, a consulta deve ser agendada eletivamente. Não deve existir dor persistente ao urinar, algo está errado.